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Potlatch
29 July - 29 December, 2019
Catalouge
Catalouge
Museu do Caramulo, Portugal
Curated by Julião Sarmento
Leonor Antunes, Juan Araujo, António Bolota, João Maria Gusmão & Pedro Paiva and Carolina Pimenta
The Caramulo Museum opens the 3rd exhibition of the Black Box cycle entitled “Potlatch”.
Curated by Julião Sarmento, the exhibition brings together six leading artists of contemporary art, including Leonor Antunes, Juan Araujo, João Maria Gusmão & Pedro Paiva, António Bolota and Carolina Pimenta.
The project Black Box is directed by the artist João Louro and consists of a cycle of six exhibitions over the period of six years shown at the Museu do Caramulo. A different artist is invited to curate each cycle, under a concept & artist selection of his choice.
O altruísmo da oferenda
“O potlatch é uma cerimónia praticada entre tribos índigenas da América do Norte, como os Haida, os Tlingit, os Salish e os Kwakiutl. Também há um ritual semelhante na Melanésia.
Consiste num festejo religioso de homenagem, geralmente envolvendo um banquete de carne de foca ou salmão, seguido por uma renúncia a todos os bens materiais acumulados pelo homenageado – bens que devem ser entregues a parentes e amigos. A própria palavra potlatch significa dar, caracterizando o ritual como de oferta de bens e de redistribuição da riqueza. A expectativa do homenageado é receber presentes também daqueles para os quais deu os seus bens, quando for a hora do potlatch destes.
O valor e a qualidade dos bens dados como presente são sinais do prestígio do homenageado. Originalmente o potlatch acontecia somente em certas ocasiões da vida dos indígenas, como o nascimento de um filho; mas com a interferência dos negociantes europeus, os potlaches passaram a ser mais frequentes (pois começaram a haver bens comprados apenas para serem presenteados) e em algumas tribos surgiu uma verdadeira guerra de poder suscitada pelo potlatch. Em alguns casos, os bens eram simplesmente destruídos após a cerimónia.”
Wikipedia
O acto de dar ou de oferecer contém quase sempre o amargo da desconfiança no altruísmo do doador. Por trás da atitude aparentemente desinteressada deste, esconde-se o alimentar da sua auto-estima pelo puro prazer da oferenda. Ao oferecer, para além do prazer que eventualmente se dá a quem recebe, está-se sobretudo a dar prazer a si próprio ao satisfazer o seu ego alimentado pelo puro acto da oferenda. O acto de oferecer, é pois, puro prazer e satisfação para si próprio. Logo, no limite, a oferta é então uma espécie de onanismo habilmente disfarçado de generosidade.
“A interpretação sociológica da troca de oferendas tem-se sobretudo focado na natureza recíproca de tais trocas e no seu significado simbólico para a integração da colectividade ou colectividades envolvidas.” (Levi-Strauss). A partir desta perspectiva a troca de bens é vista como derivando de, e reforçando o princípio moral da reciprocidade que tem efeitos subsequentes noutras formas de permuta. Sendo a reciprocidade, por definição, tida como um principio moral é evidente que trocas de presentes são trocas entre pessoas no seu papel de agentes da colectividade ou colectividades envolvidas.
Talvez seja essa mesma situação que se verifica em toda esta exposição. Estes seis artistas, ao oferecerem ao publico a possibilidade do seu trabalho ser visto e/ou admirado num contexto que não é o habitual, incorrem naturalmente numa atitude “potlatchiana”, chamemos-lhe assim, por tornarem possível a permuta da oferenda. O artista oferece, o espectador vê e aprecia, e, consequentemente, dignifica assim o seu trabalho de artista. É quase uma situação antropológica da oferenda.
Assim mesmo, cada um destes artistas participantes, contribui com a generosidade de mostrar as suas obras num contexto pré-existente, para o engrandecimento desta exposição. Refiro-me a um contexto pré-existente já que não foram retiradas as peças usualmente existentes neste museu e regularmente mostradas ao público. O que fizemos foi complementar cada uma das salas escolhidas com novas obras que com elas pudessem dialogar inteligentemente.
Esta exposição, tal como o Potlatch, é uma festa em que os artistas oferecem o seu trabalho à apreciação de quem os vê e cuja generosidade é retribuída pela consequente apreciação e fruição de quem o aprecia. É chegada agora a altura em que, tal como na cerimónia do Potlatch, a retribuição a este acto de generosidade o ultrapassa pela fruição de quem vê esta mostra.
Julião Sarmento, 2019
The Altruism of the Offering
"Potlatch is a ceremony practiced among indigenous tribes of North America, such as the Haida, the Tlingit, the Salish, and the Kwakiutl. There is also a similar ritual in Melanesia.
It consists of a religious celebration of homage, usually involving a banquet of seal or salmon meat, followed by the renunciation of all the accumulated material goods of the honoree—goods that must be given to relatives and friends. The word potlatch itself means ‘to give,’ characterizing the ritual as one of offering goods and redistributing wealth. The honoree is expected to receive gifts from those to whom they gave their goods when it is time for their own potlatch.
The value and quality of the gifts given are signs of the honoree’s prestige. Originally, potlatches only occurred on certain occasions in indigenous life, such as the birth of a child; but with the interference of European traders, potlatches became more frequent (as goods were bought simply to be given as gifts), and in some tribes, a true power struggle arose around potlatch. In some cases, the goods were simply destroyed after the ceremony."
— Wikipedia
The act of giving or offering almost always carries the bitter taste of mistrust in the altruism of the giver. Behind the seemingly selfless attitude hides the feeding of their self-esteem through the pure pleasure of offering. By giving, beyond the pleasure that might be given to the recipient, one primarily gives pleasure to oneself by satisfying their ego, fed by the pure act of offering. The act of offering is, therefore, pure pleasure and satisfaction for oneself. Thus, at the extreme, the offering is then a kind of onanism skillfully disguised as generosity.
“The sociological interpretation of the exchange of offerings has primarily focused on the reciprocal nature of such exchanges and their symbolic meaning for the integration of the collective or collectives involved.” (Levi-Strauss). From this perspective, the exchange of goods is seen as deriving from, and reinforcing, the moral principle of reciprocity, which has subsequent effects on other forms of exchange. Reciprocity, by definition, is seen as a moral principle, and it is clear that gift exchanges are exchanges between people in their role as agents of the collective or collectives involved.
Perhaps this same situation is reflected in this entire exhibition. These six artists, by offering the public the possibility of seeing and/or admiring their work in an unconventional context, naturally engage in a ‘potlatchian’ attitude, so to speak, by making the exchange of the offering possible. The artist offers, the viewer sees and appreciates, and consequently dignifies the artist’s work. It is almost an anthropological situation of the offering.
In this way, each of these participating artists contributes with the generosity of showing their works in a pre-existing context, for the enhancement of this exhibition. I refer to a pre-existing context because the usual pieces in this museum, regularly shown to the public, have not been removed. What we did was to complement each of the selected rooms with new works that could engage in an intelligent dialogue with them.
This exhibition, like Potlatch, is a celebration in which the artists offer their work to the appreciation of those who see it, whose generosity is reciprocated by the consequent appreciation and enjoyment of the viewer. Now is the time when, just as in the Potlatch ceremony, the reward for this act of generosity is surpassed by the enjoyment of those who see this exhibition."
— Julião Sarmento, 2019